As Bacantes de Eurípedes (com a entrada de Dionísio)
- I -
O mar lava a concha cava
e cava concha lava o mar
como a língua limpa lava
tua concha antes de amar.
Delírio da estrela d'alva
mistério da preamar
vinda e volta abrindo a aldrava
da concha do paladar.
Oh minhas parcas de mel!
Eu me afogo em mar vinho
à espera de algum batel.
Sou cantador de cordel:
estórias sabor marinho
bacantes da moscatel.
- II -
Canto a lira dissonante:
como custam meus cantares!
os cantochões dos solares
mais remotos que um levante.
Tua branca primavera
lança-perfume dos ares
profundo nácar dos pares
mas verdes ramas da hera.
A cigarra morta canta
tua tarde de passagem
que a voz do bronze levanta
louvores a teu passeio
de gazela: leve aragem
ao coração, meu anseio!
(III)
São Mateus bebo teu verbo
conjugado na tintura,
semi-breve partitura
na regência d'um Efebo.
Ocarina chora uvas
esmagadas no sermão,
e esconde no coração
gotas vermelhas de chuvas.
Um pombo pousa na taça
evangelho vivo de asas:
traz ao bico, verde salsa.
A boa nova rascante
que me entra pela boca
doce beijo da amante.
Aníbal Beça
(É bom estar aqui homenageando a poesia deste amigo fraterno que foi Anibal Beça. Infelizmente Anibal nos deixou há um par de anos. Convivi com ele, a quem convidei, para juntos estarmos ao lado de um animado grupo de escritores, a grande maioria de norte-americanos, denominado Outsiderwriters. Lá Anibal e eu escrevíamos haicáis na língua inglesa. Acho que jamais terei um outro amigo que seja homenageado, como ele o foi, por dois Senadores da Republica, em leitura oficial no Senado, por ocasião de seu passamento. Na verdade é o reconhecimento por Anibal Beça, esse amazonense apaixonado, nos ter legado um trabalho imenso, inclusive musical, o qual teve início nos anos sessenta, nos Festivais da Globo. Salve, Anibal... Sua obra poética sempre nos acompanhará!)
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